quinta-feira, 14 de novembro de 2013

R0BERTO CARLOS

Conhecia-o só da televisão. Mais um cabeludo, pensava. E detestava os seus programas barulhentos, com um bando histérico de fãs gritando a cada gesto do seu ídolo. Mas um dia surgiu a ideia de uma entrevista dele, exclusiva, para a Revista “O CRUZEIRO”, onde eu trabalhava há pouco tempo (sob as ordens do grande jornalista Joel Silveira). E fui indicada para fazê-la.
Lá fui eu, procurando-o pelo Rio de Janeiro. Hotel Leme-Palace onde costumava  hospedar-se, escritório do seu empresário, casas de amigos, estações de T.V.  Foi difícil, mas encontrei-o e a entrevista foi marcada.  Conversei com ele durante duas horas, no camarim  da T.V Rio, enquanto se preparava para o programa dessa noite.  Este é o Roberto Carlos sem máscara que conheci.
Uns olhos tristes.  Um sorriso bonito de menino assustado.  Simples. Humano. Dois anéis na mão direita: um de pedra azul, outro de pedra vermelha, que ele roda sem parar e que usa apenas “porque gosta”. Um relógio moderninho num pulso, uma pulseira de prata com  o seu nome gravado no outro. Vinte e quatro anos.  Muita sensibilidade.  Um ar sofrido que impressiona. Pálido. Preocupado que as olheiras não apareçam nas fotos. Educado. Atencioso. Inteligente. Já milionaríssimo. Ídolo da Jovem Guarda. Bom cantor. Bom compositor. Um homem que não tem direito à sua privacidade, que não pode amar.  Que nega tenazmente que conhece uma certa Eunice e com ela se casou secretamente.  Está pronto, até, a jurar sobre a Bíblia e a apostar os seus salários até o fim do ano contra qualquer “charanga” legal, como isso é mentira.  (Mas muitos afirmam que a Nice existe mesmo, tem 32 anos, é separada do marido e vive numa fazenda nos arredores de São Paulo.  Que os dois se amam muito e até já tem um filho).
Roberto Carlos.  Um papo firme.  Um grande coração, que comanda a jovem-guarda carioca e paulista  em campanhas beneficentes de ajuda aos pobres. E que se define assim.
“Comecei a namorar aos 12 anos. É, minha gente... fui precoce. Mas acho o casamento um negócio muito sério. Tenho tido muitas namoradinhas. Sou romântico, sim senhor, mas meus casos não vão para diante sempre por algum motivo... sei lá, talvez porque tenho uma vida difícil... gênio. Talvez porque elas ficam com ciúme das minhas fãs... mas gosto das minhas fãs. Tenho medo delas quando não estou no palco. Nas ruas me assustam, mas durante o espetáculo gosto da vibração.”
 Com os seus dedos grossos aperta um lápis com força, enquanto na folha de papel sobre a mesa começa a aparecer um desenho. E  continua, como se estivesse pensando alto. “Minha mãe me orienta e se preocupa com todos os setores da minha vida. Concordamos quase sempre, mas ela me avisa cuidado, meu filho, com essas mulheres... Acho que todas as mães dizem isso aos filhos, não? Tenho dois irmãos mais velhos, um é sargento e o outro tenente reformado do Exército. E uma irmã, casada. Todos são meus fãs... hum...sim... eles gostam da minha música.”
Chama um empregado, que passa. “Olha aqui, meu chapa, estou com uma fome danada. Quero um sanduiche big e um guaraná, por favor. Mas onde estávamos? Sim... Adoro crianças mas casamento... bem, com essa onda toda é melhor não dizer nada agora.  Se é chata a popularidade? Sim e não.  Chato é não poder andar por aí... ter de frequentar lugares em dias incertos e horas especiais,  ter de despistar os outros para ter alguns minutos de paz.”
E depois de uma pausa. “ Mas eu vou levando...Nas horas vagas... mas quais são elas? Gosto mesmo é de fazer música e pescar. Adoro rabiscar e de outubro para cá, resolvi reunir em livro todos os meus rabiscos. Que bom, chegou o meu sanduiche! Estou morrendo de fome!”  Ataca com vontade o sanduiche misto, coitado, cheio de fome, aturando uma jornalista chata e ainda tendo de enfrentar  um show de horas. E pouco depois “Já viu o meu terno militar que eu próprio desenhei? É como estão usando agora na Europa. De casimira azul-marinho, com gola, punhos e botões de veludo  vermelho.  Eu é que desenho todas as minhas roupas, sabe?  Sou católico, sim. Bastante! Tenho fé em Deus.  E gosto de rosas. Democracia é um negócio bacana. Comparar Estados Unidos e Rússia... bem, nunca estive lá, como é que posso? Mas irei um dia, pois gosto de coisas novas, e tal...  Sinto-me entusiasmado com o meu primeiro filme, considero-o barra limpíssima!”

Ele afunda na cadeira, rosto abatido. Um menino cansado que ainda tem longas horas de trabalho pela frente.  Passa a mão nos cabelos, olha-me bem nos olhos e continua. “Estou sempre viajando. Adoro samba manso, aquele que a saudosa Silvinha Telles cantava.  Sou GA-MA-DO pela bossa-nova  que se canta baixinho.. .e gosto da música da Velha Guarda.  Noel, sou fã de Noel Rosa.  Tenho músicas minhas já gravadas em italiano e inglês mas não sei bem disso... nunca as ouvi.  Espero é que me paguem os direitos autorais.  Meu primeiro emprego foi na  COFAP e meu primeiro contrato... sabe quanto eu ganhava? Cem cruzeiros novos por mês.  Não tenho competidores.  Todos nós podemos coexistir.  Ronnie Von meu rival?  Que ideia!  Ele tem um gênero, eu outro.    Não tenho medo do futuro, mas me preocupo. Louras ou morenas? Não tenho preferência... você me arranja cada uma! Gosto é de moças inteligentes e de caráter... bem, e com outras qualidades, claro! Ainda é cedo para falar de casamento, mas lá que perdia popularidade se me casasse... acho que sim  Se é triste ser um ídolo? Talvez... mas gosto da minha vida. Levei 6 anos duros para chegar até aqui e não vou mais parar. Gosto de ser Roberto Carlos, com todos os problemas do ídolo. Não gostaria de ser outra pessoa.